Monday, July 31, 2006

Manhãs: Arthur da Távola == Limbo: Elane Tomich


Manhãs

© Arthur da Távola


Manhãs indefinidas,
O Cisne de Tuonela
Vagueia na alma.
O vento está enigmático.

Manhãs sem sol,
Nem definição de vida,
Esparsas lembranças,
Atiçam o burlar deveres.

Manhãs molengas,
Somos todos interioridade,
Lembranças do ignoto
Sem alegria ou tristeza.

Manhãs brumosas
O céu indefinido.
Nenhuma cor predomina
Na alma estapafúrdia.

Manhãs ganhoperdidas
Na falta de vontade
E um torpor com algo de delícia
Pacifica a imposição do poema

Manhãs serenas
Nem preguiça nem ações
Espaço da alma em preparo,
Sem recados, alusões ou deveres.

Manhãs sorrateiras,
O bem e o mal em silêncio.
Uma dor que alivia
O susto de existir.

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Limbo

© Elane Tomich


Não, lá não tem telefone!
A estrada acaba em reta,
a música é de gramofone,
saída pequena e incerta
onde o adeus se aperta
num silêncio de renome.

Há mais janelas que portas.
Do mundo, imprecisa notícia,
assunto vago, não importa...
Há uma bruma propícia,
que encoberta o passado
trazendo idéias tortas
a um tempo pré-datado.

Não há caixa de correio.
Num espelho emoldurado,
futuro partido ao meio.

Um pouco dele é presente,
o resto é pura vigília
de flores de buganvília.
Ali a mentira não agita
aquilo que à carne grita
num resto de terra aderente.

Na casa desta charada
onde sorriu-me o sorriso
um anjo de asa quebrada
sem um pingo de juízo,
conduziu-me em travessia

à chegada da saída,
onde o medo se esvazia!

Não sei se é o que esqueço
dentro da minha saudade!
Algo em mim sabe o endereço
da minha perplexidade
Canta a ave do sono, insone,

a brisa sopra reticente,
desculpe! Esqueci meu nome,
mas acho que era Gente.

Aos Trancos e Barrancos


© Eloah Borda


Meu coração é um louco, inconseqüente,
não tem noção de tempo nem de idade,
- se apaixona com tal intensidade,
como se fora ainda adolescente!

Minha razão, coitada, certamente,
de tudo faz pra impor sua vontade.
Que vão intento - controlar, quem há de,
as emoções de um coração ardente?!

Se a razão diz: - Já tens cabelos brancos!
Já o coração me grita, a cada pulso:
- A natureza para amar me fez!

E assim eu vou, aos trancos e barrancos,
a debater-me entre o bom senso insulso,
e a deliciosa e louca insensatez...

Saturday, July 29, 2006

Soneto Para Garimpar Sonhos


© Nathan de Castro


Por quantas vezes eu me vi na estrada
a confundir cristais com diamante...
Às vezes, penso que perdi o instante
do apaixonante sonho de alvorada.

Por quantas vezes vi, sem dizer nada,
o brilho de uma pétala distante...
Não fui ao seu encontro e, sempre errante,
vaguei um verso frio à madrugada.

Juntando pedras falsas e sonetos,
sigo a marcar as curvas do caminho...
E cumpro esse meu canto garimpeiro!

Talvez uma pepita entre os gravetos
do tempo, inda me traga à flor do ninho
o encanto de um brilhante verdadeiro!

Apenas Um Cachorro Ladra Na Canção


© Nathan de Castro


Os sonetos fugiram pela noite adentro e apenas
um cachorro ladra na canção da rua iluminada
pela lua cheia.
O poema não consegue dormir com o silêncio

dos paralelepípedos, e nem mesmo uma brisa,
para acalmar o verso atrapalhado.
Os livros espalhados pela casa estão mudos e

as lâmpadas acesas lançam sombras de libélulas
bailarinas nas paredes.
Sombras de poesia calada e com passos
desencontrados. Desencontros... Exatamente
a formação que as letras relembram na página
da música.
“Quanto tempo, pois é, quanto tempo...”.

Nada me foge à lembrança. Os olhos da poesia
de uma Estrela não se apagam em uma vida.
Precisam de muitas. E a solidão é amiga da memória.
“Quanta coisa eu tinha a dizer...”. Mas se já disse

tudo nos poemas!... Talvez eu não saiba falar
de amor com a caneta, ou não existam palavras
convincentes nas mãos do meu poeta.
Talvez pareça tudo mentira, já que de minha boca

as palavras não saltam os trilhos e tropeçam
em pedras e metáforas de minérios de ferro...
Sina de poeta das Gerais.
O telefone não toca!... Nenhuma mensagem

na caixa postal!... Silêncio!...
Ausência de motivos para escrever sonhos.
Apenas um cachorro ladra na canção.


Amanheceu e o sol revela novas sombras
no pátio ladrilhado de um velho soneto
repetitivo, triste e detonando bombas
nas mãos do meu poeta torto e irrequieto.

O verso livre e solto quase sempre assombra,
machuca as folhas brancas do sonho encoberto,
carece de alegria e, quando acende, zomba
de um louco prisioneiro sem sinais abertos.

“Quanto tempo, pois é, quanto tempo...”. A canção
mastiga o calendário e as rimas da ilusão,
enquanto um passarinho canta no arvoredo.

Feliz quem sabe o amor nos galhos da estação
e voa na poesia sem tocar o chão...
Ausência de palavras não lhe mete medo.



Friday, July 28, 2006

Primaveras


© Nathan de Castro


Um passarinho verde pousou na folhagem
em frente ao meu poema com cheiro de agosto
e quando bateu asas, levou a paisagem
nas asas do destino de eterno desgosto.

Um pássaro agourento acompanha a viagem.
Os ombros do poeta lhe servem de encosto,
e quando o verso insiste em fugir da voragem,
ele exibe um sorriso estampado no rosto.

Solidão de um acaso que o tempo e o silêncio
escondem nas crateras das frases de luas,
enquanto o meu poeta alimenta as saudades...

Os olhos de setembro ele avista à distância:
as flores, beija-flores e o verde das ruas.
Primaveras dos sonhos de felicidades.

Wednesday, July 26, 2006

Canto de Amor VI


Lílian Maial


Onde anda aquele, por quem meus versos escrevo em pedras, por quem meus sonhos se acendem néons coloridos?
Onde anda o construtor das palavras, aquele que me guarda em medos, aquele por quem enfrento luas?
Eu, que te li nas estrelas, que te encantei em rimas, tua musa, tua ninfa, a que te aquece as horas de frio e os minutos de solidão.
Eu, que te quero tanto, em verso,em prosa, em tapetes aveludados de canções, em labaredas de malte e olhares de paixão.
Eu, tua menina, a que te sorri em pedras falsas, a que te presenteia com profundas covas, e que te promete a tempestade, inundando a boca e as entranhas.
Eu, aquela por quem esperaste, aquela a quem sempre temeste, a doce amada que de ti mesmo ocultaste, a louca idéia de felicidade.
Por onde anda aquele que não quer provar da dor, aquele que ergue o escudo ante meus apelos, aquele que me tomaria de um só trago, mas que não consegue tocar o cetim de minha pele exposta?
Por onde anda o poeta das constelações apaixonadas, das pedras silentes, das rochas brutas de ânsias milenares,
dos rios e seixos, dos torturantes seios... dos sedutores lábios, dos silêncios?
Vem, meu amado, para junto do teu destino! Vem desvendar os mistérios dessa tua deusa, revelar os segredos mais profanos do teu âmago, os receios mais apavorantes da tua alma!
Vem, vem me fazer sentir as esporas do teu amor tão tímido, os açoites dos teus dedos de carinhos, a volúpia dos teus lábios de conchas!Vem, que te espero em alcova de nuvens, que te recebo em meu ventre de quimeras, para te entregares, sem pejo ou tormento, ao aconchego dos meus braços de serpente, que te envolvem sem pecado na paz do meu amor.

Versos de Bananeiras


© Nathan de Castro


Brincando nos meus quintais
aprendi a falar besteiras
e a ler os velhos jornais
nas moitas das bananeiras.

Degustei beijos fatais
co’as minas namoradeiras,
reinventando as catedrais
nas sombras das bananeiras.

Virei poeta e jamais
livrei-me destas zoeiras
de rabiscar temporais
nas folhas das bananeiras.

Abelhas, vespas, pardais,
nódoa na roupa e caveiras
de cobras corais, animais
e umbigos de bananeiras.

Com gosto de quero mais:
varandas, chuvas, goteiras...
Versos devolvam meus ais
aos cachos das bananeiras!

Tuesday, July 25, 2006

Luzes


© Nathan de Castro


Eu sei a lua, o sol e a cor dos teus cabelos,
quando na noite a estrela vem me brilhar versos.
E a cada linha e a cada ponto, em teus reflexos,
transcendo a dor e acendo as letras de escrevê-los.

Misteriosa brisa acalenta as imagens
e nas manhãs despertam rimas no teu corpo.
No cais, um barco atraca sonhos no meu porto,
o mesmo sol, a mesma lua... E essas miragens.

Eu sei o veio e o rio da paixão que emboca
águas de cachoeiras, lua, sol e os medos.
Eles espelham luzes de um beijo na boca.

Sei um poeta e, agora, as penas destes dedos
voam nas folhas brancas de estrelas — gaivotas —,
para que à noite eu durma em paz, com meus segredos.

Monday, July 24, 2006

Preciso Quebrar o Silêncio


© Naldo Velho


Preciso quebrar o silêncio, libertar o verbo, faz tempo, aprisionado em mim, desentranhar sentimentos, materializar substantivos, enfatizar adjetivos,construir uma oração onde o tempo seja o eterno recomeçar.
Preciso quebrar correntes, revelar segredos, atirar pela janela todos os meus guardados, móveis, tapeçarias, utensílios, quadros, deixar a casa vazia, inclusive de espelhos... Preciso me reconstruir por inteiro.
Preciso telefonar, urgentemente, para aquele amigo que se fez ausente.
Preciso saber onde errei e se ainda há tempo, e se não errei: preciso saber aceitar seu silêncio.
Preciso abrir portas e janelas, deixar o vento varrer toda a casa, e que os pássaros invadam a sala, preciso alimentá-los, principalmente de amor.
Preciso me apaixonar outra vez, reler tuas cartas, escrever outras, dizer que te amo, e ainda quê, há tanto tempo, ao meu lado, te abraçar com ternura, tratar de ti com cuidado.
Preciso cuidar melhor do meu jardim, regar na medida certa, flores e folhagens, podar alguns galhos secos, retirar ervas daninhas, partes amareladas, apodrecidas.
Preciso do abraço amigo, dos olhos nos olhos sem máscaras,da palavra que exorcize o medo de falar daquilo que gosto, e ainda assim, deixar bem claro que respeito, quem prefira de um outro jeito e compreendo a vida que têm para viver.
Preciso caminhar por este mundo, respirar o ar que ainda posso, rever lugares, pessoas, cidades, varar madrugadas desertas, saborear frutas colhidas sem pressa, curtir o som das águas de um rio a lapidar pedras, margens caminhos, sentir o cheiro da chuva, das ervas escolhidas, remédios.
Preciso rever lua cheia e que não seja contaminada pelas luzes que vêm da cidade, e ao amanhecer forasteiro num lugar distante de tudo, entender que a vida podia ser diferente daquela que eu escolhi pra viver. Preciso acreditar que ainda existem muitas vidas a serem vividas e muitos outros lugares por onde eu possa me conhecer.
Preciso caminhar pela praia, sentir a areia entre os dedos, colher pedrinhas, conchinhas, reencontrar aquela sereia, mergulhar com ela nas águas, pedir a benção madrinha! Licença, pro teu filho, vim te visitar.
Preciso morrer daqui a algum tempo, e que seja uma morte sem dor. Que eu encerre como se fosse um poema, escrito por urgências de vida, por inquietudes estranhas, latentes, e eu fiz o melhor que pude! Fui um poeta, ainda que tardio, da linguagem da minha gente; pois sou caboclo, mestiço, cafuzo, visceralmente confuso, sem medidas métricas ou rimas,confessadamente insano pelo muito que semeei.
Preciso comer certas sementes, deixar que elas germinem e, no tempo certo, floresçam livremente lá dentro de mim.

Sunday, July 23, 2006

Fogueira


© Nathan de Castro


Se me encontrares pelas ruas, não sou eu:
sou este aqui, que escreve e chora versos tolos.
O que caminha pelas ruas traz nos olhos
as letras das canções dos beijos que perdeu.

Se me encontrares pelos bares, navegando
em copos de cerveja com velhos amigos,
após o quinto copo verás, quando em quando,
um vulto anuviado que sai dos abrigos.

Mas quando nas tardes nós nos encontramos
na fogueira de um verso com galhos e ramos
recolhidos no chão do nosso pensamento,

o poema que nasce é dor e fingimento,
da loucura à razão, e se espalha ao vento.
Brasas, cinza e fumaça... Nada aproveitamos.

Saturday, July 22, 2006

Apetite


© Nathan de Castro


Poeta de mim,
poeto depois que a chuva
encanta a sua música sagrada.

Perdido de mim,
danço e brinco de arco-íris,
não vejo potes à beira da estrada.

Só vejo a enxurrada.

Pés descalços,
caminho a enxurrada, navego a enxurrada,
bebo a enxurrada, devoro a enxurrada,
com o apetite de um verso apaixonado.

Friday, July 21, 2006

Apenas o Silêncio Cinza das Saudades


© Nathan de Castro


Vou perdido no vácuo dos velhos sonetos
buscando a forma exata e a cor da maresia.
Sigo a cantar a noite em plena luz do dia
juntando folhas secas, palhas e gravetos.

Trago no verso um mar, de antiga fantasia,
cravado nas canções dos sonhos incompletos,
perpetuando o branco e preto nos trajetos
que me levam aos trilhos tortos da poesia.

Colecionando sombras, letras e bagagens,
em troca o tempo acende as rugas da passagem
e forja esses grisalhos tons de tempestades,

sem óculos não vejo a flor destas paisagens,
a lente embaça e esconde o verde da mensagem,
apenas o silêncio cinza das saudades.

Thursday, July 20, 2006

Soneto Blues


© Nathan de Castro


Procuro um novo verso, azul de passarinho,
com ritmo de blues e voz de cachoeiras,
e que traga o sabor das letras do bom vinho,
para cantar o amor sem notas carpideiras.

Alvorada de sonho e a brisa de um carinho
no rosto das palavras verdes das paineiras,
brincando na estação da esperança de ninho,
enquanto a dor suspira as águas derradeiras.

Tudo é questão de mágica no olhar do verso,
e as luas dos encontros se vestem de afoite,
para abraçar o sol antes que chegue a noite.

Quisera essa canção e as luzes do universo,
iluminando a praça e as ruas da poesia...
Seria, o meu soneto, a música do dia.

Wednesday, July 19, 2006

Passageiro de Estrelas


© Nathan de Castro


Os versos que rabisco não têm pedigree.
São uivos de saudades de um lobo poeta
que em noites de luar retira da gaveta
as pedras da poesia que um dia escondi.

Passageiro de estrelas – triste silhueta –
que sabe o vôo alegre e a flor do colibri,
mas canta só as lágrimas que eu recolhi
das velhas cachoeiras do meu lado asceta.

Fera faminta em noite clara... Figurante
dos contos de aventuras em telas distantes,
onde a canção do amor maior ficou perdida?

Vem rabiscar luares de uma nova vida,
reescrever a história deste viajante...
Cansado estou das pedras de luas minguantes!

Tuesday, July 18, 2006

Jogo


© Nathan de Castro


O vício de escrever poemas me acompanha
com rimas de enxurradas aos rios e mares,
onde as palavras brincam, servindo manjares
em pratos de soneto e taças de champanha.

Embriagado, o verso busca outros lugares,
um canto de luar no topo da montanha,
onde o silêncio habita e a solidão me arranha,
mas me ensina os segredos de outros paladares.

O meu poeta insiste, vem e me tortura,
diz que a paixão é bela e, sem pestanejar,
obedeço e arremesso outro navio ao ar.

Sou mesmo capitão de sonhos - releitura -
e sigo sempre em frente, na luz da loucura,
conjugando as tolices do tal verbo amar.

Monday, July 17, 2006

Pássaro Cinzento


© Nathan de Castro


A realidade tem voz de calabouço.
Esconde o sol, as luas e a poesia.
E tudo o que ela dita apenas ouço,
mas não rabisco um nó de serventia.

A realidade é o cárcere dos loucos.
Esses normais que vagam de alquimia
na guerra alucinada por tesouros,
para comprar motivos de alegria.

Por vezes, uma máscara me pega
com a vontade acesa atrás das grades,
clamando a insanidade de um momento.

Mas meu dragão cinzento não se entrega,
tem penas de paixões, sonhos, saudades
e sempre volta ao verso e à paz do vento.

Wednesday, July 12, 2006

Delírios num boteco, com Quintana


© Nathan de Castro


Pelos bares da vida eu aprendi
a destilar sonetos de bandeja,
depois de mergulhar na parati
e nuns versos regados com cerveja.

Para cumprir a sina eu me esqueci
do sol, pois um poeta sempre almeja
brincar de lua e estrelas... Quando vi,
já estava amasiado com a peleja.

Ao som de um violão desafinado,
batucava palavras de saudades...
Sambas, boleros, fados e chorinhos.

Paixões têm dessas coisas de passado
e, no presente, os sons das tempestades...
Futuro?... Ah! O amanhã... Nós, passarinhos?

Tuesday, July 11, 2006

Passaporte de Estrelas


© Nathan de Castro


Não quero a realidade das migalhas
de amores maltratados pelo tempo.
Deixo aos pardais a canga dessas calhas,
prefiro a solidão dos meus sonetos.

Feridas de armadura e velhas tralhas?
Ah! Valham-me a poesia e seus ungüentos:
cheiro de terra e a grama das orvalhas
manhãs de canarinho e o som dos ventos.

Que vou querer das teias, dos escombros
e dos cacos de vida para a morte?
Reqüesto a madrugada e aceito os ombros

do lusco-fusco azul de olhar tristonho
e abraço a luz de estrelas: passaporte
para voar nas letras dos meus sonhos.

Monday, July 10, 2006

O Cara


© Nathan de Castro


Eu sou o cara e a cara que apresento
tem os sinais e as marcas da loucura
de bardo atrapalhado em meio à fúria
das tempestades mórbidas do tempo.

Eu sou o cara e o cara que alimento
tem fome de poesia e uma fratura,
causada pelas pedras da luxúria,
no peito acostumado ao passatempo.

Eu sou o cara, o morto-vivo, o ausente,
o que perdeu o amor e, numa prece,
quis ter de volta os olhos do poeta.

Voltar a ser criança?... Felizmente,
o tempo não tem volta, e se tivesse,
traria as mesmas rugas na careta.

Sunday, July 09, 2006

Uma Noite Qualquer Sem Estrelas...



© Lílian Maial


As noites borradas do inverno
não permitem ver as estrelas.
Vem um silêncio de brilhos,
um cheiro de céu desolado.

E então chega a dor,
a lágrima efervescente,
vontade de lembrar o que não foi vivido.
Ânsia de nunca ter morrido.

Escorre e corrói,
não poupa os dias,
as manhãs frescas de sol,
os passeios de brisa no rosto.

As noites nubladas de inverno
não dão guarida aos que sobram.
Implacável rajada de espera,
de um tempo que falta pouco.

E então vem a certeza,
a paz imposta do deserto,
o desembainhar de olhares empoeirados,
a seca de devaneios.

Árida é a madrugada sem ópio.
Em outras estações,
um sopro de promessa ainda embala o engano.

Nada mais triste que uma noite sem estrelas...

Saturday, July 08, 2006

Divagações

© Nathan de Castro


Nas minhas retinas guardo o silêncio dos beijos
e o abraço das árvores à espera das tempestades.
As luzes dos dezembros cantam páginas de luas.
- Por séculos e séculos, as lembranças farão

coro aos sabiás, donos daquelas alvoradas. –
Um beijo na ponta do nariz... Início, meio

e fim. O gozo ficou guardado nos alpendres
e sofás dos momentos de pupilas.
Canções mágicas que os versos não conseguem
explicar.
Somente após perder os passos aprendi a contar
estrelas, mas as nuvens são visitas noturnas...
Sempre aparecem e escondem as palavras.
Quando acordo, o dia amanheceu de sol.
Canto o sol.
Nada que se possa entender.
Meu canto não explica a origem dos sonhos
e não mede os passos das profecias das alvoradas.
Quem explica a vida?
Quem ensina os caminhos do destino
e as pétalas pós-morte?
Não que o meu canto seja vida... Ou morte.
O meu canto é apenas silêncio e paixão.
Tão inexplicável quanto a vida e a morte.
Ah! Essa coisa de enterrar saudades!
Eu choro e morro do mal de poesia, a cada dia,
e não tem pedra, na pequena rua Irmã Dulce,
que já não tenha sentido a fúria dos meus sapatos.
Pouco a pouco, o bairro e toda a cidade...
Essa mania de chutar palavras e pedras me

acompanha.
(e o apito do juiz)
O locutor grita: __ Fora!... (sempre).
Nunca encontro a curva que sabe o ângulo

superior ou o caminho da meta.
Nem mesmo as traves sabem o impacto dos versos
que saltam do meu peito.
Essa coisa de jogar sem o apoio da torcida...
Essa coisa de jogar sem torcida...
Punição insana para quem sempre jogou poemas
e driblou os adversários, pensando driblar
os perigos que se escondem nos campos da poesia.
As árvores do Parque Sabiá conhecem os poemas
do futebol.
O meu poeta conhece, tão somente, o canto do sabiá.
Ele não entende de táticas, de posicionamento,

ataque e defesa...
Tem uma lua cheia brincando de pingar estrelas

de orvalho nas folhas verdes do poema.
Eu, só.
Nas minhas retinas, o silêncio dos beijos.
Nada para se entender.
O meu canto é apenas silêncio e paixão.
Ah! Essa coisa de enterrar saudades!
Eu choro e morro do mal de poesia, a cada dia.
Rio Grande... Rio Paranaíba... Triângulo Mineiro...
Ah! Essa coisa de cantar triângulos...
Eu canto.
Um beijo na ponta do nariz... Início, meio e fim.

Friday, July 07, 2006

Palhaço

© Nathan de Castro


De tanto amar, o sol desenha a cada dia
uma nova paisagem verde no horizonte,
e a terra, agradecida, bebe da poesia,
mas à noite se esquece e fecha a velha fonte.

A inspiração solar repete o juramento,
não perde tempo e acende a luz noutro quadrante,
ataca no oriente, enquanto atiça o vento
com explosões solares — versos de um amante!

Meu caro amigo, faze como o sol: insiste,
e queima essa paixão na ponta da caneta,
revela o lado oculto e a capa da revista.

Se for loucura amar assim, oh! meu poeta,
então és louco, e o louco em ti é o meu artista:
palhaço da loucura azul que me completa.

Thursday, July 06, 2006

Soneto Cibernético

© Nathan de Castro


Quando a razão me chama, fico estático
feito uma estátua esquálida e patética,
rejeito a letra e abraço a nova tática
poética de bardo cibernético.

Quando a ilusão estende os seus tentáculos,
aceito a rima... As flores são de plástico,
mas, também, fazem parte do espetáculo
dos campos digitais... Canteiros mágicos.

Busco as canções de espíritos lunáticos,
para entender a vida e seus fantásticos
momentos de explosões enigmáticas...

Talvez o verso entenda o meu fanático
poeta de alma chip e peito trágico...
Maluco das paixões melodramáticas.

Wednesday, July 05, 2006

Chave Mestra

© Nathan de Castro


A chave do soneto ainda me assusta
— não abre as portas do teu coração —
e arrombar a canção por vezes custa-
me um verso atrapalhado e sem razão,
que ri da música e se embarafusta
nas entrelinhas pobres de emoção.
Oh! Musa dos meus sonhos... Oh! Augusta
poesia, companheira da ilusão,
deixa que eu sinta a paz que se me ajusta
quando a palavra estende a sua mão
e arranca do meu peito essa vetusta
Saudade amiga e dona da paixão.
Se a porta não se abre, abra a janela
de um verso que me ensine a esquecê-la.

Tuesday, July 04, 2006

Soneto de Engenho

© Nathan de Castro


Para se ter da cana uma cachaça boa,
alambico as palavras com cana caiana
e o mel da rapadura entoa no meu verso
tardes de feriados e fins de semana.

Canaviais de estrelas na rua deserta,
misterioso engenho de açúcar mascavo
curtido nos carvalhos do peito poeta
em mil e uma noites de favos de lua.

Moendas de soneto e a garapa gelada,
sementes e quintais de pomares floridos:
rimas de limoeiros, limões, caipirinha.

Sabores de poesia, luares e amigos.
Quatorze mata-burros, poeira e os sonidos...
Canções e serenatas de antigas estradas.

Monday, July 03, 2006

Sonhos-de-Valsa

© Nathan de Castro


Não creias nas palavras dos poetas.
Elas carregam pedras de outros mundos.
Por mais que te confortem, são profundos
os cortes provocados pelas tretas.

Não tentes entender os moribundos
que nem sabem do amor a paz completa
e vivem de explicar com uma caneta
o que a razão explica em um segundo.

Versos de amor?... Ah! Livra-te das falsas
palavras recolhidas na sangria.
- O que é paixão não sabe a luz do dia!

A vida não é a mágica das valsas
em sonhos de papéis amarrotados.
Lá fora o mundo exige outros bordados.

Sunday, July 02, 2006

Saturday, July 01, 2006

Cordel da Seleção

® Lílian Maial


Adentrei nesse cordel,
Pra contar para vocês,
O Brasil virou freguês
Da dona da torre Eiffell,
De um azul da cor do céu,
Dominou logo o Parreira,
Que, de tanta tremedeira,
Se escondeu atrás de um Gordo,
Só gerando desconforto
Pra torcida brasileira.

A torcida bem gritava
suplicava por Robinho,
Ou, quem sabe, um Mineirinho,
Que é gaúcho, mas jogava,
quando o moço disparava,
não deixava nem poeira,
mas o troncho do Parreira
fica sempre sobre o muro,
relegando ao escuro
A nação futeboleira.

Adriano não tem jeito,
não tem pinta de vitória,
nas Europa é outra história,
talvez, por não ser direito,
eu não bata a mão no peito,
e dá pra desesperá...
Mais ninguém vai agüentá
Ver a equipe tão parada,
Aguardando, aperriada,
Nova caca do Kaká.

Com tanta carta na manga,
Lá no banco de reserva,
A pasmaceira me enerva,
A teimosia me zanga,
Inté isquimó de tanga
Sabe o que fazê c'os moço,
Não carece de alvoroço,
Só armá a marcação,
E deixá os garoto bão
Comê angu de caroço.

Se os homi tá de manha,
É jogá água gelada,
Não se vence com pelada
Frente os time na Alemanha,
Tem mais teia que aranha,
Tão colado, não se mexe,
Ronaldinho não se avexe,
Teu sorriso é que me mata,
Mas o jogo num empata,
Pede ao dentista que feche!

Roberto Carlos, seu asno,
Teu negócio é só chutá,
Canta a bola pra ganhá,
Que num güento tal marasmo!
Tua dupla com Erasmo
Fez mais sucesso que a Copa,
Tua cantiga me dopa,
E não me dá sono eterno,
Pois que vá tudo pro inferno,
Quem sabe o Demo te topa?

Mas pra falar do Cafu,
Tem que tê muitcho respeito,
Já que o homi tem no peito,
Cabelo branco de Itu,
Mais parece um brucutu,
Fica véio e num arreda,
Mas, em campo, quanta méda,
Erra passe sem querê,
E eu num quero nem sabê,
Qual o asilo que lhe hospeda.

Juninho Pernambucano,
Esperança do nordeste,
Homi lindo que é da peste,
Mas na gente deu um cano,
Dois mil e seis era o ano,
Pra mostrá que tem ainda,
A chance de outra berlinda,
Pra brincá no Carnaval,
Com as duas pernas de pau,

Ser boneco lá de Olinda!

O Emerson, truculento,
Não demonstra na ciência
ter a tal inteligência.
Parecido cum jumento,
Pros amigos tem ungüento,
Seu abraço é uma fratura,
Com seu jeito de candura,
Coleciona, em paralelo,
Tanto cartão amarelo,

De pular a dentadura.
O que salvou a lambança
Foi a zaga campeã:
O Dida, o Lúcio e o Juan
Herdaram nossa esperança,
Que se acabou contra a França,
Por conta de tal teimoso,
Que, vendo o time horroroso,
Não fez nada pra mudar,
Quem não faz, fez por levar,
Um a zero vergonhoso.

Esse time tinha espertos,
Que não puderam mostrar
Que viriam pra ficar,
Como foram os dois Gilbertos,
Garotos bons e abertos,
como o Fred e o Ricardinho,
com a garra do Cicinho,
tinha chance de vencer,
se o negócio é correr,
que ze dane o Ronaldinho!

Zé Roberto inda tentou,
Com seu fôlego de gato,
Mas no fim pagou o pato,
De correr tanto cansou,
Pois ninguém se aproximou,
E se ninguém se aproxima,
Nem no cordel faço rima,
Vou buscar na maratona
Lutador que vem à tona:
Vanderlei Cordeiro Lima.

Mas eu brinco de mangá
Desse time canarinho,
Que merece meu carinho,
Mesmo sem pudê ganhá
, Pois eu vô crucificá
Um culpado pelo choro
Que a nação chorô em coro,
E mantém a choradeira,
O culpado é o Parreira,
Essa uva é desaforo!

Mas ele não tá sozinho,
Muito bem acompanhado
De um senhor aposentado,
Que não larga esse empreguinho,
Vai morrê que nem pintinho,
Por conta de tanto embalo,
Ocês sabem de quem falo,
Um ex-tudo nessa vida,
Pra gostá tanto da lida,
Tem que tê nome Zagallo!

E agora, pra acabá,
Vô dá uma sugestão,
Que é um homem de visão,
Pra Seleção arrasá,
Vô mudá um titulá,
Que vai seguir bem a bula,
Deve ter sido gandula,
E no meio do rescaldo
dedurou o Gordo Ronaldo...
Para técnico: o Lula!

Soneto em Transe ( para Glauber Rocha )

© Nathan de Castro


O poeta vagava pelas luas
cortado a sete facas, na sangria,
enquanto a terra em transe adormecia
e o medo abria as portas com gazuas.

Nas trevas do eldorado sem poesia,
ele juntava as vísceras nas ruas,
pingando suas dores... Seminuas
bandeiras desfraldadas e vazias.

Soldado sem vitórias e impotente,
onde a explosão da bomba? Onde a miséria?
Qual verso sabe o sangue de uma artéria?

Quando o golpe da dor se faz urgente,
levanta-se a palavra e segue em frente...
Poesia não rima com matéria!